Cozinha da Matilde

Vitrolinha – Saudades da Favelinha

Nasci em Mogi das Cruzes, há 50 km de São Paulo, mas há 15 anos moro em São Paulo (vixe maria, quanto tempo!). “Já morei em tanta casa que nem me lembro mais“, mas na verdade lembro sim. Há 8 anos moro com o Will e os outros 7 vivi em repúblicas e um pensionato, tirando o ano que morei nos EUA.

Este pensionato, (que hoje não existe mais porque deu lugar a um prédio de luxo na Rua Ministro Godói, em Perdizes), era uma loucura! Pelo menos, não tinha hora para chegar, mas tinha hora pra usar a cozinha e o pior: a responsável, que gostava de ser chamada de “tia” passava inspecionando todos os quartos depois que a gente tomava banho. Porque se ela encontrasse a toalha molhada em cima da cama ela CON-FIS-CA-VA! A Mariana acho que perdeu umas 3. Chego a dar risada lembrando dela discutindo com a “tia”.

A Mari fez o colegial comigo. A gente não era próxima, mas eu e o Mosca, ex dela, éramos da mesma turma de amigos. E eu passei em Direito na PUC, ela em Moda na Santa Marcelina, as duas loucas para sair da terra do caqui, e totalmente sem grana para alugar um apê juntas, fomos para o pensionato e quem sabe encontrar outras meninas para dividir um teto. E foi fácil. No nosso quarto, que tinha duas beliches, também estavam a Marcela, que fazia Direito, e a Roberta, da Moda.

Empolgada que sou, já na primeira semana senti que nós quatro poderíamos morar juntas, e assim foi. De lá, fomos para a Rua Cardoso de Almeida, num apartamento gigante de dois quartos, um quartinho do amasso (digo de empregada), e um horroroso carpete cinza. Para o nosso querido lar, demos o óbvio apelido carinhoso de favelinha.

Na divisão dos quartos eu fiquei com a Roberta e a Mari com a Marcela. E numa época sem internet e pirataria, a gente tinha alguns CDs, mas o arsenal mesmo era de fitas K7. A Roberta, que tinha uns amigos descolados em Pirassununga, era a que tinha as músicas mais legais. Tinha Pixies, Led Zeppelin, Rolling Stones, No Doubt. E ouvia tudo no repeat. Sério. Sorte que a música era boa. Umas das que a gente mais gostava era Bad Time do Grand Funk Railroad. Ficávamos o dia todo com o refrão  “I’m in love with the girl I’m talking about /I’m in love with the girl I can’t live without” na cabeça.

A Mari curtia coisa fina também. Aprendi bastante coisa com ela. E depois que ela ganhou um carro, era uma delicia as nossas voltas pra São Paulo. Ela passava na casa dos meus pais depois do Sex and the City, que passava na HBO, e eu ficava como co-pilota e trocando os CDs. Ela tinha uma paixãozinha pela Alanis Morrissete, sabia todas as músicas de cor e salteado. Mas no seu case também tinha Jamiroquai, Marisa Monte, Djavan. E o Manual Prático para Festas, Bailes  e Afins Vol. 1 , do Ed Motta. Um disco inteirinho delícia, que a gente ouvia bastante, mas a gente só descobriu que adorava o disco depois que fomos ao show. Daqui pro Méier, embalava como um vídeo clipe as nossas andanças de Corsinha preto.

A Marcela não ligava muito para as nossas músicas, ela tinha um estilo meio “ 7 melhores da Joven Pan”. Mas o engraçado é que ela gostava de uma faixa de uma coletânea da Roberta, a I Touch Myself, do Divinyls. Ela não imaginava o que queria dizer a música da mulher que, quando pensava no namorado…., bom, você sabe:

E eu fui morar fora do país, a Roberta saiu para morar com a irmã e a Renata, também de Mogi, que fazia jornalismo, entrou na casa. E eu voltei pra favelinha. E o Kazaa e o AudioGalaxy foram criados.

Com a Renata, a identificação musical foi bem rápida. A gente passava madrugadas ouvindo Chico Buarque. Ficávamos analisando letras do Legião Urbana. Nós nos entendíamos com o Indie Rock, tínhamos mp3 dos Strokes, Travis, Belle and Sebastian. E ela tinha uns dois CDs do Mundo Livre S/A, que a gente delirava: mangue beat, o sotaque pernambucano, as letras panfletárias e cheias de malícia. Lembro que fazia uma dancinha na Bolo de Ameixa  http://www.youtube.com/watch?v=Jm8jc0E_eR4.

A Mari comprou um apê e foi embora. Não passou muito tempo, e depois de cinco anos, a nossa relação com a favelinha foi se degastando, de uma forma natural e sem tristeza. Cada uma foi para um canto. Nos formamos, vida nova, outros amigos. A Marcela nunca mais tive notícias. A Roberta trabalhou com a Mari, que ainda vê bastante a Renata.

Com as redes sociais a gente obviamente voltou a saber uma da outra. A Roberta teve a Poliana, um mês mais velha que o Tom. A Renata é uma super jornalista, edita um site super famoso. A Mariana juntou com a irmã  e são sócias da Pair, e fazem bolsas, sapatos, cintos e acessório maravilhosos.

E eis que a Mari me convidou para fazer um set no último dia do bazar que ela e mais umas lojas incríveis de Mogi, vão realizar: o Pop Bazar, nos dias 09, 10 e 11 de agosto. Fiquei empolgadíssima, porque além de tudo, vai ser a primeira vez que eu vou tocar em Mogi!

Para isso, estamos conversando bastante sobre o evento, e entre uma mensagem e outra falamos de nossas vidas, com muito carinho e com muito amor, como se a gente tivesse se encontrado ontem. A sábia Roberta, no ano passado, antes de entrarmos numa sessão no Cinematerna, matou a charada, ao me ouvir falar: “Nossa Rô, que intensa a nossa conversa, nem parece que a gente ficou tantos anos sem ver”. Ela no melhor estilo Robertice, respondeu: “ai Má, nós somos AMIGAS, né?”.

Ps: Girls, se a gente ainda morasse juntas era essa música que eu estaria ouvindo no repeat. João Donato é um gênio e essa música na voz da Gal Costa…