Invencionice: Pimentão recheado aberto na panela com almôndegas
Pimentões recheados são um clássico de família. Era com eles que minha mãe recebia os amigos com meu pai, na época em que eles moravam aqui em Sampa e ele fazia estágio no hospital do servidor. A turma desterrada de Uberlândia se alegrava e confortava com o panelão de cores intensas, muita sustança e cheirinho de comida de mãe. Cresci vendo minha mãe repetir a receita por uma longa fase em que pimentões “abrilhantavam” os almoços de domingo! Até que um dia sumiram da mesa. Com certeza substituído por um outro preparo delicioso que brilhou por outra temporada!
Eu nunca tinha feito (fora as vezes em que participei do preparo em casa), até um dia em que Marcelo me perguntou: – Sabe fazer pimentão cheio? Minha mãe sempre fazia!
Foi a deixa. Fiz uma panelada à moda minha mãe (diferente da mãe dele, que só usa carne no recheio). Ele adorou e pediu bis. E os pimentões recheados entraram para o rol dos preparos favoritos da casa.
No cafofo praiano ele é repetido à exaustão, funciona super bem no fogão pequeno, uma vez que é um cozido, não demanda chama forte como um salteado, e também é perfeito porque, montada a panela, te permite uma esticada na rede, uma descida até a praia para contemplar o pôr do sol enquanto cozinha devagar… comida acolhedora desde o preparo!
E foi no cafofo, durante as férias (depois de Minas e Goiás ficamos 15 dias fazendo nada à beira mar!), que tive a ideia de fazer uma nova versão de pimentões recheados abertos na panela.
A inspiração partiu das sobras do recheio de carne com arroz que sempre viram pequenas almôndegas, que acrescento nos vãos da panela entre os pimentões, e que ao final ficam deliciosas e dão uma turbinada na quantidade de recheio por porção. Marcelo, mega guloso, ama! Foi daí que pensei, porque não fazer direto as almôndegas e com elas formar uma flor na panela com pétalas de pimentão?
Foi o que fiz logo na semana que voltei e que agora você confere. Modéstia às favas, não ficou lindo?
Essa receita aqui tem duas peculiaridades à moda da minha avó:
1- Além de carne também vai arroz no recheio, bem à moda libanesa. Era o mesmo recheio que ela usava para fazer o malfulf (charuto de folha de repolho).
2- Cozinhei as almondegas direto no molho como a vó Maria fazia. Ela, que era quase avessa à fritura (era naturalmente light), achava um absurdo fritar almôndegas (mesmo as tradicionais só de carne) antes de colocar no molho. Preferia cozinhá-las nele: – Mais saudável, minha filha!
Ingredientes:
As quantidades são variáveis de acordo com o tamanho da panela. Tem que ser o suficiente para completar o volume.
Eu usei uma panela de 28 cm de diâmetro e para este volume foram necessárias as seguintes quantidades:
Pimentões e almondegas
- Pimentões coloridos cortados em gomos no sentido do cumprimento. Usei 1 laranja, 1 e 1/2 amarelo, 2 vermelhos e 1 verde;
- cebolinha pérola inteiras o suficiente para cobrir o fundo da panela;
- 600 g de carne moída – eu usei fraldinha, que adoro;
- 1 xícara de arroz branco lavado e seco;
- 1 cebola brunoise;
- 1/2 xícara de salsinha fatiada finamente;
- 4 pimentas bode (opcional);
- folhas de salsinha inteiras para finalizar.
Molho de tomate
- 6 dentes de alho brunoise;
- 1 cebola média brunoise;
- 2 colheres de talos de salsinha laminados finamente;
- 3 latas de tomate pelado;
- 4 colheres (sopa) de azeite;
Modo de fazer:
Molho de tomate
Sue a cebola e os talos de salsinha no azeite com uma pitada de sal; Acrescente o alho e deixe suar.
Junte o tomate pelado e duas latas de água. Deixe ferver e passe tudo pelo mixer. Deixe reduzir em fogo alto por 1o minutos.
Ajuste o sal e reserve. Deve ficar um molho um pouco ralo pois a redução vai terminar durante a cocção das almôndegas.
Almôndegas
Se você, como eu, gosta de pimenta comece amassando algumas com sal no fundo da tigela como fazia minha avó.
Acrescente a carne, o arroz, cebola e salsinha. Misture tudo com as mãos até obter uma mistura homogênea.
Faça bolinhas com a massa. Reserve.
Montagem da panela
Para começar forre o fundo da panela com cebolinhas pérola inteiras ou partidas ao meio se forem um pouquinho maiores. Elas evitam que a carne grude, uma vez que com a panela montada não é possível mexer o preparo durante a cocção.
Ao fim, as cebolinhas cozidas assim ficam doces e suaves, deliciosas para acompanhar a carne.
Comece a montar as pétalas segurando as pontas curvadas do pimentão com as cebolinhas. Feita a primeira camada (eu alternei pimentão vermelho e amarelo) acrescente as primeiras almôndegas.
Comece a nova camada (fiz com pimentões verdes e vermelhos) prendendo o pimentão na cebolinha e mais almôndegas sobre elas. E assim sucessivamente até chegar ao centro. Eu finalizei com o pimentão laranja pequeno que ficou lindo no miolo. No centro disponha o restante das almôndegas.
Montada toda “a flor” na panela cubra tudo com o molho de tomate, tampe e leve ao fogo baixo por aproximadamente 30-40 minutos ou até as almondegas estarem cozidas.
Polvilhe a panela com as folhas de salsinha e sirva imediatamente na panela mesmo! Fica delicioso puro ou com pão!
Bom apetite!
Harmoniza com… por Marcelo Pedro (No copo) e Marina Novaes (Na pick’up)
A sugestão de hoje vai ser um tinto super eclético, um Pinotage sulafricano.
A uva pinotage é a varietal mais típica da vinicultura da África do Sul. Fruto do cruzamento da Pinot noir com Cinsault, em 1925, quando a Cinsault era conhecida na África do Sul como Hermitage, dai o nome Pinotage.
Produz vinhos de uma cor rubi, com aromas de ameixas e bons taninos na boca, que enfrenta bem pratos de carnes, assados com molhos intensos, em especial Carneiro. Também acompanha bem pratos condimentados tailandeses e currys, principalmente os Pinotages mais jovens. Esta versatilidade o torna bom acompanhante de diversos pratos com carnes e molhos bem condimentados, como as almôndegas no molho vermelho com pimentões.
Foi menosprezado por um bom tempo, mas a partir dos anos 90, é o principal vinho varietal sulafricano, e vem aparecendo em bons cortes, principalmente com a Merlot, que amacia seus taninos. E tem outra boa noticia: vc encontra Pinotages despretensiosos nos supermercados por preços bem acessíveis. Ótimos para refeições cotidianas.
Cheers!
A história deste pimentão recheado, é tão bacana porque simplesmente faz a mesma coisa de outro jeito! E acho incrível quando se faz isso, porque além de tentar se reinventar, é uma possibilidade de ter outras experiências e também de sair da rotina.
Por isso eu acho que é uma boa idéia experimentá-lo junto com o CD novo da Juliana Amaral, o SM, XLS – Samba mínimo, extra luxo super.
A idéia deste projeto vem desde 2008, quando ela se apresentava com um violão e percussão, misturando samba de autores de diferentes gerações, com leitura de poemas. Do show veio o CD, e em grande parte das suas faixas, Juliana é acompanhada por um só instrumento, falando tanta coisa intensa… Tem vibrafone, viola caipira, cavaquinho, clarinete, contra baixo acústico, piano, saxofone e sanfona.
Eu vi ao vivo, na estréia no SESC Pompéia (o disco é pelo selo SESC) e achei muito lindo, emocionante e poético, incluindo a cenografia, e a interpretação. E os vídeos, são uma história a parte, obedecem uma seqüência tão paulistana, urbana, nostálgica e desconstruída.
E no fim é como os pimentões recheados, gostosos sendo abertos ou fechados. É samba! E “é tudo uma grande invenção”: