Cozinha da Matilde

Gostoso demais #6 – café com queijo

O dia começa na beira do curral, em uma fazenda de gado leiteiro. É da ordenha que chegam os primeiros sons da manhã, e enquanto o sol termina de nascer e começa a se firmar, ainda com a cabeça enevoada, entre acordado e sonhando, as pessoas vão se posicionado com canecas de café e um pedaço de queijo nas mãos. Quem toma leite já estende a sua pra ganhar uma esguichada quente, direto das tetas da vaca.

A conversa ainda é lenta, em volume baixo, interrompida pela passarinhada e um ou outro mugido. E à medida que enche os pulmões com cheiro de pasto misturado ao do café recém-coado, a gente vai se dando conta do dia. Dos muitos rituais matinais, esse é o meu favorito.

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Era assim na minha infância em Goiás, e continua assim na Serra da Canastra. A gente acorda no pasto, quebra o jejum com um naco de queijo e molha a prosa num gole de café.

E essa combinação faz todo sentido pro paladar, em especial se a gente considerar um café de boa qualidade. Quando é produzido a partir de bons grãos, e com processo de secagem e torra corretos, rende uma bebida com uma complexa estrutra de sabor, que vai muito além do amargor típico dos cafés comuns supertorrados. É possível perceber as notas adocicadas e levemente ácidas características da fruta, e essas notas casam perfeitamente com a pungência e acidez de queijos. Se me permitem dizer, combina mais que vinho.

É, meu bem, o mineirim matuto, de bobo não tem nada, não. E seu ritual matinal vem fazendo escola: tem muito restô chicoso e baristas bacanudos harmonizando café com queijo em refeições cheias de elegância. Portanto, não se espante se a dupla chegar à sua mesa ao fim de um jantar fino; feche os olhos, encha os pulmões e aproveite a deixa pra viajar até a beira do curral, e se quiser pode até emplacar uma moda de viola!

A política do café com leite

Essa combinação de café com leite/queijo vai além do paladar, e definiu por muitos anos os rumos da política nacional, que alternava no mando oligarcas paulistas (o café) e mineiros (o leite).

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Na chamada República Velha, entre os anos de 1898 (presidência de Campos Sales) e o movimento que levou Getúlio Vargas ao poder em 1930, mineiros e paulistas mandaram no país e angariaram de par a par uma série de regalias para seus estados, em especial no controle da arrecadação e alta de juros de importação, sempre favorecendo São Paulo e Minas Gerais.

Esse modelo, privilegiando dois estados em detrimento dos demais, gerou um desequilíbrio que atenta contra o próprio conceito de federalismo, que prevê a igualdade entre os estados federados como um dos princípios que o rege. Os quase 40 anos da política do café com leite, somados à baixa internacional do valor do café e ainda à quebra do acordo de alternância no poder por São Paulo, que indicou dois presidentes sucessivos (Washington Luis e Julio Prestes, quem nem chegou a tomar posse), acabou levando o gaúcho Vargas à presidência, apoiado por paraibanos e mineiros descontentes com os paulistas.

A política do café com leite ficou pra história, mas o cafezinho acompanhado de um naco de queijo continua um campeão de votos nesse país gostoso demais!

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Texto e fotos: Letícia Massula – Revisão: Valéria Pandjiarjian